A minha recordação mais antiga talvez seja eu de pé no quintal do meu tio quando ele veio de África, só porque alguém me levou até ali. Esse meu tio apontava-me a máquina fotográfica e eu, que nunca havia visto tal objeto, senti-me muito envergonhada de estar ali à mercê de algo desconhecido e então estiquei os braços para os lados o que resultou numa fotografia em que pareço cheia de preguiça, mas quem der atenção notará que é vergonha. É disso que me lembro, essencialmente, esticar os braços por não saber o que fazer com tanta vergonha.
Tinha três anos e qualquer coisa.
O resto, o que vem a seguir, recordo porque a fotografia foi posteriormente parar lá a casa e cresci com ela guardada na lata das fotografias.
Envergava uma sainha vermelha feita pela minha mãe, plissada e com peitilho de tiras, camisola e colãs brancos, numa malha grossa. A saia era mesmo muito curta, tanto que se via mais acima do que seria desejável, moda infantil do início dos anos '70, presumo.
A camisola era mesmo muito grossa, a julgar pela minha aparência tão redondinha... Aliás, eu devia ter várias camadas de roupa, que a minha mãe, sempre tão protetora, não deixava a gente passar frio, não.
Os sapatinhos eram azuis-escuros, rasos, com uma presilha no peito do pé, outra moda infantil, esta perdurou décadas nos pés dos petizes portugueses.
Tinha uma franja rala e alourada e sorria meio perdida e algo descontente com a minha vida naquele momento.
Sim, tenho a fotografia aqui em casa, surripiei-a da lata da minha mãe, é um pedaço de papel que reflete uma imagem a cores desfocada, onde se podem ver inclusive os vasos da minha tia, porém não a publico para não verem a minha roupa íntima bem como a minha timidez ainda tão pueril. A bem dizer aquela menina já não existe, seria desleal colocá-la no blogue.
2 comentários:
Publica-a, por isso mesmo. Essa figura já não existe.
É um ponto de vista diferente. E bem-vindo, também. Não digo que ponha aqui a foto mas pelo menos estou a pensar nisso agora... ;)
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