Primeiro refúgio: banco de pedra. Para apontar tópicos e depois escrever assim:
Lisboa; praça de Londres, 13:32; 27º
Vi o homem que sofre de elefantíase. É mentira, não sofre nada, eu é que o comparo ao monstro da bela e como acho que esse monstro tinha parte com a estranha doença, olha, pumba, coiso.
A passadeira está pintada de novo, apresenta-se-nos branquinha, branquinha.
A avenida tal tem algumas vivalmas, poucas. A avenida coisa não tem vivalmas, tampouco veículos. Que é feito das gentes? Pouco me importa a vastidão da área, quero eu dizer: sem pessoas, que assim é tanto melhor, se menos pessoas para me moer a cabeça, melhor.
Segundo refúgio: lugar da musa. Para apontar tópicos e depois escrever assim:
Logo que entrei no lugar da musa que título de livro vejo eu...? 'O Sexo Começa na Cozinha'; (Kevin Leman). Ah ah.
'O café continua a sessenta cêntimos', dise o moço do lugar da musa. Pois. Ele disse 'continua' porque há muito tempo que lá não aparecia, deve estar a fazer substituição. O 'continua' dele não foi para mim, que regressei hoje, vinda não se sabe de onde, ida não se sabe porquê nem como. Uma semana, foi só uma semana, a ausência.
Não percebo porque ela pigarreia tanto se tem os tornozelos cobertos por um daqueles modelos dolorosamente feios, que sandálias feias.
Não tem nada a ver. Tu sabes disso, eu também. É do ar condicionado, aquele pigarrear constante.
O título deste post - 'Passeio norteado' - tem a ver com o passeio e com o norte, norte de ponto cardeal e não Norte de zona, mas norte no sentido de me sentir orientada, com um plano na cabeça, que eu cá sofro horrores indizíveis se me ponho a andar por aí, sem um querer, sem um destino.
Ontem, nas rebuscas pelos roupeiros por alturas da sua limpeza profunda, encontrei uma caneta dentro de uma das minhas malas. É uma caneta toda xpto mas não gosto de escrever com ela. Tampouco me lembro em que moldes veio parar à minha vida e à minha mala, mas é estranho, que eu cá nunca gostei de escrever a traço fino e ademais este tracejar agarra-se com força ao papel, quase não consigo levantar a caneta, o que faz com que a minha caligrafia pareça ainda mais feia, quase ilegível.
Está aqui a Shakira e aquele senhor que não se parece com ninguém.
Terceiro refúgio: muro à sombra. Para apontar tópicos e depois escrever assim:
Comprei uma t-shirt. Fui a duas lojas de saldos. É gira, é curta, largueirona, mas não me faz parecer um bloco grosso, e tem umas letras douradas que bem podiam dizer YSL para ter categoria, mas não. Fiquei de olho em outras duas, uma azul e outra vermelha mas de outros feitios, e, por modo a não me escaparem, não vá haver pilim em breve, quem sabe, há esperança no porvir e isso, coloquei-as na segunda fila de um expositor que está assim não muito perto da entrada, no meio de muitos pares de calças. A ver se ainda lá estão quando eu precisar.
Árvore amarela, verde vai ela. E também amarela em pontinhos e em folhinhas. Poucochinhos e poucochinhas.
A minha mola de roupa, dependurada na folha de uma árvore na rua mais bonita de Lisboa, a infeliz. Infeliz, creio. Bom, se calhar não está nada infeliz, a mania que eu tenho de que só faço mal às coisas, às pessoas. Bah.
As árvores dessa rua, numa correnteza de umas treze, penso, amanhã conto-as, estão a murchar, a acastanhar, a ficar manchadas, secas. Prenúncio de outono. Pois.
Isto de gostar de rever a mola de cuja presença já nem me lembrava, lembra-me o prazer imensurável que tenho sempre que relembro coisas e/ou factos dos quais não teria memória se não os escrevesse, arranjando assim maneira de os reler e relembrar.
Planta à janela, dizia eu há bocado? Nem vê-la, agora. Cá pra mim a planta era posta ali por alguém que estava de férias e como as férias se acabaram, coiso.
14:46, agora. Quase não ia tendo tempo para me sentar no muro e matar saudades de tudo quanto aqui se pode desfrutar.
Quarto refúgio: a minha memória. Para nela apontar um tópico e depois escrever assim:
Lisboa; praça de Londres; 14:48; 30º
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