sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Abstrato

É sexta-feira. Hoje não vou passar o dia escolhendo bolos cá por dentro. Este fim-de-semana não vou estar em casa. Este fim-de-semana não vou ter hipótese de fazer bolos. Este fim-de-semana vou passear. Este fim-de-semana vou. Vou-me. Me.
Escrever. Escrever-se. Se.
Repudio as vírgulas. Bem tento ser diferente mas é difícil achá-las colocadas no tempo certo. Gosto de pontos finais. O abruptamente escrevendo está comigo.
Viver ou morrer. É assim a vida: tem a morte certa em tempo incerto. A incerteza da vida perante a morte. Atenção: a frase apresentada em itálico não me pertence.
Batman. Chamam isso ao homem que anda de sobretudo aberto, zanzando pela rua porque faz recados ao senhor doutor do escritório. Quando anda o sobretudo esvoaça. Já falei disso aqui. Batman. Cruzo-me com ele várias vezes por dia e em todas recebo um alegre cumprimento.
Ah, eu sabia que ia para aqueles lados e encontrava rebentos. Há pontinhos verdes espreitando em alguns ramos e umas folhas mais adiantadas num deles. Tão vivaz. Tão bonito.
Sonho. Hoje sonhei com farinha. À falta de disponibilidade – mental e prática - para os bolos, sonho com o abastecimento da despensa. Colocava a farinha na caixa, era de cor diferente, cinzenta. Que feia.
Dia de. Disseram na Radio. Ontem: era dia dos morangos. Não os comprei mas vi-os numa prateleira da loja de fruta bonita e incapaz. Por partes: uma bonita, outra incapaz. Morangos bonitos mas um tanto ou quanto verdes e portanto um tanto ou quanto incapazes para ingerir. Verdes junto ao caule, vermelhos no cume. Não os comi mas creio que no caule seriam salobros e aguados e no cume ácidos, de polpa filamentosa e sumarenta. 'Aguados'; 'sumarenta', se a água tem sabor, é sumo. Hoje: é dia da Maria. Olá, sou a Maria. Quase nunca me lembro disso.
Diz que as mulheres sonham com o chefe e o namorado da melhor amiga e outros que tais. Os homens sonham com mamas e nalgas e qualquer orifício do corpo feminino, as mulheres sonham com palavras atenciosas e um ou outro músculo mais definido ou todo um arcaboiço que aparente vigor, digo eu. Homens e mulheres são seres humanos, o que liga com cérebro, o que liga com emoção, o que leva à imaginação, portanto: imaginam cenas e as cenas são tão mais empolgantes - tão mais - se imaginadas com outra(s) pessoa(s) que não a(s) pessoa(s) do costume, porquanto dessa(s) se conhece os podres e os(as) outros(as) são idealizados a bel-prazer do(a) pensante. E as mulheres idealizam e sonham, verdadeiramente, só por dizer que isso lhes traz cadastro. Que putas.
Bem, está na hora de apresentar a coisa, ainda que me repita. Tenho de escrever para aguentar o viver. Sério. Posso mentir, mas não. Posso dizer que daqui a nada vou ali e quando voltar vou estar aqui. É uma verdade. Posso ironizar. Posso revelar. Posso ironizar revelando as minhas verdades. Já me avisaram: olha que escrever enlouquece, olha que cais numa espiral de onde não sairás. Sei como é, 'migo – se avisa é 'migo -, entrei nessa espiral há largos anos e hoje possuo um grau de loucura maior, mas uma loucura manhosa e controlável. Sou portanto uma louca que não choca, uma louca como deve ser.
Não estou lá muito irónica, hoje. Não lhe sinto a falta, ainda. A ironia brota se falo doutros, ou então de mim mas sem ser em dias de miserabilidade existencial, como estes últimos.
Rascunhos. Tenho dois rascunhos mais abaixo, neste documento onde todos os dias escrevo. Um fala de beleza feminina, outro dos 'Dias de um Ginásio'. Neste exploro o assunto com a ironia do costume. Estes rascunhos não servem para publicar hoje, passam para o mês que vem.
28 de fevereiro, o derradeiro dia do curto mês.
Há drama no texto d' hoje. Pergunto. Eu não sei. Decerto há bruteza, que isso há sempre. Mas hoje há só isso. Pergunto.
Da normalidade. Deitei sangue do nariz, coisa pouca. Tenho ranho seco e muito escuro dentro do nariz. São sobejas. Quem tem uma dor fala dela. Partilha o sofrimento. Comunica com os semelhantes como se fosse muito importante. Tanto a dor intensa, assim a importância. Quem tem uma dor grande fala dela grandemente. Ninguém vai querer ler as minhas dores. Nem os meus, no presente ou pela hora da minha morte. Mas isto de escrever é um fundamento da minha existência. Olha aqui eu a mostrar a alma dorida. Bah. Sai tudo a fugir.
Abaixo do texto deixarei uma imagem. O dia não é (foi) assim tão destituído de alegria para que não encontrasse os motivos do costume para fotografar. É um feto bebé numa perspetiva esquisita. Ainda me lembrei de clicar direito aos quavros mas era mais do mesmo, e mais do mesmo, hoje, não.
Doravante a sexta-feira podia ser o dia do 'post abstrato'. Mas não. Nada disso. Sou tão rebelde. Horrorizo-me com regras. No lbogue. Blogue. Um blogue regrado, não.

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